Gerir recursos e otimizar processos. Estes são dois imperativos que se colocam às empresas de moldes, rumo a um futuro mais sustentável. Uma das metas é a descarbonização. Para a alcançar, é preciso adotar um conjunto de medidas e ações que coloquem em harmonia tudo o que compõe uma organização, seja a nível ecológico, económico, social e até cultural. O tema esteve em destaque no dia 11 de abril, no decorrer do segundo workshop do projeto Low Carbon (dinamizado em conjunto pela CEFAMOL e o CENTIMFE). Mais de meia centena de profissionais do sector juntaram-se, no Centro Empresarial da Marinha Grande, para uma reflexão que, para além das empresas, juntou docentes e especialistas nesta área.
O projeto Low Carbon, realizado ao abrigo do PRR, tem como objetivo o desenvolvimento de um Roteiro para a Descarbonização da Indústria de Moldes. Na abertura da sessão, Manuel Oliveira, secretário-geral da CEFAMOL, lembrou que “muitos clientes do sector começam a olhar para esta questão como uma necessidade e, por isso, é importante as empresas prepararem-se para ela”.
O tema ‘Gestão de recursos e otimização de processos’ foi desenvolvido por Rafael Pastor, consultor e professor, para quem “é imprescindível que as empresas apostem numa gestão de recursos mais eficiente, centrando-se nas ações que tenham um maior impacto na sua pegada carbónica”. O desafio, advertiu, “é minimizar o impacto ambiental sem pôr em causa os lucros da empresa”. Para isso, é necessário que as empresas trabalhem na sua maturidade. Quanto maior for a maturidade, mais preparadas estão as empresas para avançar nestas matérias, defendeu.
As exigências dos clientes nesta matéria começam também a ganhar dimensão, lembrou, exemplificando com o caso da indústria automóvel. Para assegurar um processo de mudança, é necessário que, para além de medidas concretas, as empresas apostem também na sensibilização dos seus trabalhadores e que se juntem a organizações, como a CEFAMOL e o CENTIMFE, cujo papel considerou fulcral para apoiar neste processo.
“Temos de otimizar processos para minimizar os custos e emissões, explorar novas oportunidades de eficiência, introduzir novas tecnologias, novos materiais, novas práticas de design e usar ferramentas estatísticas”, defendeu, considerando imprescindível que as empresas colaborem entre si e desenvolvam processos de inovação contínua, apostando em tecnologias de suporte. Um dos aspetos que ressalvou como essencial passa pela “redução de desperdícios”.
A mudança faz-se passo a passo, no seu entender. E um dos primeiros é a identificação dos processos com maior impacto na descarbonização. Depois, sublinhou, a otimização dos processos é fundamental, bem como a sua avaliação. “É preciso ter em conta, sempre, questões como a satisfação do cliente e eficácia, a eficiência e a adaptação à mudança – sendo esta crucial para o sucesso da empresa”, explicou.
Por cada processo, aconselhou, é necessário definir metas ligadas à pegada de carbono, de forma a poder trabalhar sobre elas. E estas metas têm de ser específicas, mensuráveis, alcançáveis, relevantes e com previsão temporal. “As empresas têm de adotar uma estratégia holística para melhoria dos processos e gestão dos recursos”, defendeu.
O primeiro painel de debate foi moderado por Cecília Vicente (que foi, durante muitos anos, coordenadora das áreas de inovação no CENTIMFE), que, na sua intervenção, destacou o papel que tem tido, nesta e noutras questões, a colaboração das universidades e centros tecnológicos.
Ricardo Ferreira (Intermolde) partilhou com os presentes a experiência da empresa, que se dedica ao fabrico de moldes para indústria vidreira. Conseguir a eficiência máxima dos processos, tendo em atenção as questões da sustentabilidade, tem sido, no seu entender, uma das prioridades.
Há meia dúzia de anos, como resposta ao desafio de um cliente, a empresa realizou o primeiro levantamento carbónico do produto que fabrica, tendo continuado, desde então, a desenvolver esse processo. Atualmente, tem adotadas várias medidas no âmbito da certificação pela metodologia EcoVadis, para além de outros passos na questão da sustentabilidade que, reforça, “é algo ainda muito novo”.
Em comum com os moldes para plásticos, lembrou que também a sua produção é ‘uma ferramenta’, o que, em termos de impacto, “é uma gota de água na cadeia de valor”. “A produção do molde deve ser mais eficiente, mas todo o processo de fabrico tem de ser analisado, desde a decisão de compra de um equipamento, até à introdução de novos processos e tecnologias de vanguarda”, defendeu.
Como exemplo da experiência da Intermolde, contou que a empresa acaba de criar uma unidade de produção, para, com base na sustentabilidade, assegurar garrafas mais leves, através de um novo processo de fabrico.
Para Victor Neto (Universidade de Aveiro), um dos aspetos importantes nesta questão passa pela recolha e tratamento de dados. “É necessário um tempo de análise dos processos”, salientou, destacando que, um outro aspeto prende-se com a capacitação dos trabalhadores, algo que considerou “fundamental” para assegurar um processo eficaz de mudança.
Como ponto de partida, aconselhou as empresas a fazerem uma análise daquilo que têm e adaptar as ferramentas à sua realidade, de forma a alcançar a sustentabilidade ambiental, social e económica. E, a exemplo da escolha dos eletrodomésticos com base na classe energética, também a seleção de máquinas e equipamentos deve ter esse aspeto em atenção. “Todas as escolhas que as empresas fazem devem ser criteriosas, tendo em atenção as questões ambientais”, reforçou, enfatizando que, para que tal resulte, “é imperativo que sejam escolhas baseadas em métricas fiáveis”.
Coube a Ana Pires, do CENTIMFE, desenvolver o tema ‘Descarbonizar: caminho para a eficiência’. Começou por destacar que a importância de apostar na descarbonização é evidente, devido aos fenómenos que se sentem, associados às alterações climáticas e os seus efeitos no planeta.
Explicando que o projeto Low-Carbon pretende conduzir o sector de moldes para reduzir o carbono até 2050, adiantou que “as fórmulas estão a ser estudadas, de forma a criar estratégias e mecanismos de apoio para as empresas e ajudá-las nesta transição”. De entre estas, destacou uma ferramenta gratuita, online, que permite a cada empresa gerar, automaticamente, o cálculo da sua pegada carbónica. “Temos soluções que vamos implementado com as empresas”, acrescentou.
Em termos práticos, explicou que para reduzir as emissões com eficiência, é necessário ‘eliminar’ (emissão de CO2), alterando os processos; apostar na ‘reutilização’; e, apenas no final do processo, ‘compensar’, de forma a equilibrar as emissões. Nesta matéria, lembrou, há empresas que optam por dar passos mais amigos do ambiente como, por exemplo, a plantação de florestas. Contudo, acentuou, “é complicado aferir e garantir que ‘aquela floresta’ está, de facto, a compensar a pegada carbónica da empresa que a plantou”.
Destacou ainda que para reduzir é preciso medir e, para isso, são necessários dados e o seu tratamento, considerando que “este processo ganha eficiência através da Inteligência Artificial (IA) e do machine learning”. A IA, explicou, consegue, por exemplo, ajudar na otimização do consumo de energia, na manutenção preditiva, prevendo falhas e consumos, e até na gestão das frotas.
Mercedes Domingues, também do CENTIMFE, falou da ‘Eficiência para a criação de valor’, salientando, na sua intervenção, que “alcançar a neutralidade carbónica, em 2050, é um imperativo”. E isto significa “fazer igualar as emissões aquilo que podemos capturar, ou seja, ter um saldo zero”. Por isso, destacou que é preciso trabalhar na redução das emissões, não apenas nos processos, mas também nos produtos e equipamentos.
As empresas, no seu entender, devem apostar em metodologias que assegurem eficiência e circularidade, aproveitando os recursos e melhorando a reciclabilidade dos produtos e moldes. O reforço das energias renováveis é um dos passos, exemplificou.
Um dos grandes desafios, considerou, passa por reduzir o desperdício e o retrabalho. Para tal, é preciso conhecer bem o processo de fabrico e, se for caso disso, é fundamental trabalhar no desenvolvimento de novos processos de produção, bem como da sua gestão, de forma a torná-la mais eficaz.
Mercedes Domingues defendeu ainda que “é preciso criar valor para o cliente”, percebendo as suas expectativas, o que valoriza e “fomentar a criatividade e inovação, definir as melhores práticas de comunicação e marketing e criar atributos distintivos”.
É necessário também “conhecer a cadeia de valor, de forma a criar valor não apenas para o cliente, mas para todas as partes interessadas”. A eficiência, enfatizou, “pode ser sempre melhorada”.
Com a descarbonização, o objetivo é tornar a eficiência mais verde, ou seja, apostar na ecoeficiência. E uma das questões que se coloca nesta matéria é a necessidade de criar fórmulas que permitam assegurar a circularidade do molde, ou seja, acompanhar o seu final de vida.
As mesmas, no seu entender, “melhoram a indústria: seja a nível de reputação, diferenciação, destaque no mercado, fidelização do cliente, seja de redução de custos e de riscos, melhoria de acesso a financiamento e criação de mais valor”. Assim, mais do que um desafio, esta é, no seu entender, “uma oportunidade de reduzir custos e incrementar valor e ser mais competitivo”.
No painel que se seguiu, o moderador, Paulo Novo (IPL), defendeu a premência de ter materiais mais sustentáveis e processos mais eficientes, equipamentos com características adequadas e métodos eficientes.
Jorge Laranjeira (Moldit) salientou que, atualmente, para estar no painel de alguns clientes é preciso integrar determinados critérios relacionados com a sustentabilidade. A Moldit, explicou, faz recolha de CO2, no âmbito dos critérios (scopes) 1 (emissões diretas das empresas) e 2 (emissões indiretas provenientes do consumo de energia). Contudo, no terceiro critério (restantes emissões indiretas, resultantes da cadeia de valor), ainda não. “Conseguimos controlar o nosso produto e o nosso processo, mas não sabemos, por exemplo, o que acontece ao molde a partir do momento em que entra em casa do cliente”, exemplificou.
A recolha e tratamento de dados, que permite medir com rigor a atividade da empresa, é, no seu entender, fundamental. Exemplificou que isso tem permitido melhorar processos em termos de eficiência energética. “Só conseguimos ter certezas se medirmos”, acentuou. Para tal, sublinhou, “há um percurso tecnológico que é preciso fazer”.
Contudo, frisou, a descarbonização é apenas um dos itens ligados à sustentabilidade. “As empresas têm de submeter relatórios de sustentabilidade. É preciso fazê-lo para entrar nos painéis de fornecedores de alguns clientes”, salientou, considerando que “este é o caminho lógico da evolução”.
Já Luís Marrazes (Tecnimoplás) destacou a importância de, ao pensar na criação de valor, abarcar todos os critérios, desde os visíveis aos intangíveis. As questões, no seu entender, estão todas interligadas, desde a económica à financeira, à social e ambiental. “Quando falamos em criação de valor, todas têm de ser contempladas”, defendeu.
Descodificou alguns dos conceitos de valor e eficiência aplicados ao negócio e ao fabrico do molde, acentuando que têm de ser considerados também os aspetos micro e os macro. E nestes segundos, lembrou a importância que têm as questões que não são controláveis pelas empresas, como, por exemplo, os conflitos armados e as pressões sobre a economia mundial, mas, advertiu, estas questões são ponderadas pelas empresas, mas não pelos clientes que, “no final do dia, só veem um valor: o preço. E, para o alcançar, temos de baixar os custos”.
Conseguir encontrar formas de o fazer é, no seu entender, um fator distintivo, porque permite que a empresa concretize negócios e aumente eficiência. “É para aqui que temos de caminhar”, defendeu. No seu entender, é preciso medir para conhecer o real impacto de cada ação na atividade da empresa. É necessário estar atento à rentabilidade dos equipamentos, bem como às soluções que existem. E é crucial adaptar os processos de fabrico e rentabilizar os equipamentos.